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Vista interior do local onde repousa Peter Tosh, perto de onde ele nasceu, no condado de Westmoreland, na Jamaica (foto HIM)

Parte III: A Consequência

Por ICA

Sexta-feira, 11 de setembro – A cena no Hospital das Indias Ocidentais é das mais confusas. Todos os envolvidos no tiroteio estão em estado de choque, e sendo tratados de seus ferimentos. Joe Borzeki chega lá e encontra Peter Tosh morto e Jeff "Free-I" Dixon em coma. Marlene Brown e Joy Dixon são tratadas e recebem alta, enquanto Carlton "Santa" Davis permanece por causa de uma ferida em seu ombro. Michael Robinson é o mais seriamente ferido, pois foi atingido em três diferentes partes.

Sábado, 12 de setembro – O corpo de Free-I continua em coma. Santa está sentado na cama falando exclusivamente com os membros da família. Seu ombro e sua mão estão enfaixados. Marlene tem apenas um arranhão de bala que passou de raspão em sua cabeça. A mesma bala atravessou a boca de Joy, deslocando-lhe alguns dentes. Joy também recebeu um ferimento em sua perna direita.

Domingo, 13 de setembro – É marcada a cirurgia para remover as duas balas que se encontram na cabeça de Free-I. A operação foi adiada duas vezes devido ao seu estado de enfraquecimento. As investigações estão a cargo do sargento-detetive Hugh Miller, da estação de polícia de HalfWay Tree. A reação em torno do mundo é única: de choque e credulidade. O Primeiro Ministro Edward Seaga apresenta suas condolências e diz: "Este acontecimento mostra mais uma vez a necessidade de se intensificar a busca contra elementos criminosos em nosso meio... O desaparecimento de Peter Tosh será enormemente sentido não só na cena artística local, como internacional..." Michael Manley, ex-Primeiro Ministro e líder da oposição diz: "Peter Tosh deu ao mundo um legado inesquecível de seu trabalho musical que será executado e cantado por muitas gerações". Chamando os assassinos de "uma mancha de vergonha para todos os jamaicanos" , Manley diz, "nós devemos condenar todas as circunstâncias da nossa história e o mal que se manifestou na sociedade, fazendo com que alguns de nosso povo considerem uma arma mais importante do que um arado... nós não podemos continuar assim".

Outros comentários: Headley Jones, Presidente da Federação de Músicos da Jamaica, da qual Peter era membro honorário, citou, " a morte de Tosh deixará atrás uma lacuna que será difícil de preencher... a perda é mais trágica da forma como aconteceu..."

O Movimento Anti-Apartheid da Jamaica publicou uma declaração que pagava um tributo a Peter "por sua música militante, especialmente como ele não poupava esforços em usar seu lirismo para condenar as maldades do sistema apartheid". Eles salientaram como "todos os talentosos cantores jamaicanos não se deixam intimidar pelas forças do mal, mas que eles devem tomar conta de suas batutas e continuar a divulgação de seu lirismo consciente".

A reação na América é enorme. A figura de Peter é vista na CNN e em todas as redes de televisão. O disc-Jockey Jeff Barnes espera que a morte seja "a faísca que ilumina o povo pra dizer BASTA à violência armada na Jamaica".

*** "HA' UM PUNHADO DE CARAS QUE USAM TRANÇAS, MAS QUE ESTÃO A UM MILHÃO DE MILHAS DO RASTA – ELES SÃO COMO A NOITE E O DIA, PERCEBE?".

Segunda, 14 de setembro – Free-I morre ainda em coma na Unidade Intensiva do hospital. A cirurgia que havia sido marcada nunca aconteceu. Todos, com exceção de Michael Robinson, estão liberados do hospital.

Terça, 15 de stembro – Alvera Coke, mãe de Peter Tosh, que afirmara ser Peter órfão de pai, e sobre quem Marlene acusou de tê-lo abandonado aos cuidados de uma tia aos três meses de idade, é expulsa da casa de Peter em Barbican por Marlene, que a recebeu com uma infinidade de insultos. A Sra. Coke tinha vindo para discutir os arranjos do funeral, esperando enterrar seu único filho em sua casa em Westmoreland. Marlene respondeu-lhe, "eu não gosto de você e Peter não gosta de você também" . A Sra. Coke pede-lhe, "deixe-me enterrar a minha criança" .

Quinta, 17 de setembro – É decretada a prisão de Dennis "Leppo" Lobban sob acusação de três assassinatos. Ele vê sua figura na TV em conexão com os assassinatos e, dizendo-se inocente, vai ao escritório do Conselho dos Direitos Humanos. A polícia chega e prende-o.

Terça, 22 de setembro – Há rumores abundantes sobre ligações entre Peter Tosh e Dennis Lobban. Um "chalice" encontrado ainda queimando na casa de Peter acrescenta combustível no comentário de que as mortes estão ligadas ao tráfico de marijuana.

*** "GANJA É UM PARAISO NA AUSTRALIA..." - 1972, para a polícia, depois de receber sua primeira "batida".

Uns dizem que foi uma transação de cocaína mal feita, outros falam que Lobban estivera na prisão por posse ilegal de uma arma roubada em cumplicidade com Peter, e que este lhe havia dado dinheiro para isto. Alguns dizem que foi crime político.

George Wayne do "Carib News" de Nova Iorque, diz que lá houve tanta especulação, que o aconteceu a Peter é somente uma questão de tempo que veio à tona e que Marelene Brown é parcialmente responsável.

"Há um considerável mistério, um misticismo acerca de Marlene Brown". Santa Davis relata, "Peter foi assassinado porque seu poder espiritual estava abaixado a zero. Ele estava sendo controlado por um vampiro que sugou-lhe toda a força, a vida fora" .

Quarta, 23 de setembro – Durante os dias que se seguiram após a morte de Peter, Marlene começa os preparativos do enterro no Cemitério Dovecot. Um dia antes do enterro, o escritório do Primeiro-Ministro a chama para dizer-lhe que, como esposa ilegítima, ela não tem direitos sobre o corpo de Peter. Eles explicam que a mãe de Peter é legalmente autorizada para isto. Marlene recusa-se a participar das cerimônias dizendo, "Eu tinha que fazê-los sentirem-se mal, porque eles estavam fazendo-me sentir pior" .

Sexta, 25 de setembro – Marlene anuncia no "Daily Gleaner"que Peter morreu sem um centavo. Ela também declarou que a EMI, gravadora de Peter nos Estados Unidos,. Nunca pagou direitos autorais ao cantor. Ela não menciona se eles foram pagos adiantados. A EMI lançou recentemente uma coleção com o melhor de Peter Tosh (direitos autorais 1988). Peter estava buscando um recurso legal na época de sua morte. Ele também estava envolvido numa discussão sobre o patrimônio dos Wailers, exigidos pelo próprio Peter e por Bunny Wailer.

*** " NOS (OS WAILERS), DEPOIS DE TODO AQUELE TEMPO, ESTAVAMOS COMO TRES TOUROS NUMA ARENA? TRES SUPERSTARS. EU NÃO SOU SUPERSTAR E NÃO CONHEÇO QUEM SEJA... APENAS JAH. TODO AQUELE TEMPO NOS ESTIVEMOS CANTANDO PARA AS PESSOAS, CRIANDO UM CONFLITO POLITICO, POIS QUANDO EU DEIXEI O GRUPO, ELES DISSERAM QUE FOI PORQUE EU ESTAVA EM CONFLITO COM BOB. EU NUNCA ESTIVE EM CONFLITO COM MARLEY, E SIM COM A SITUAÇÃO PELA QUAL EU ESTIVE DURANTE TODA A MINHA VIDA. ESSE BOATO DIFAMOU MEU CARATER, DESAFIOU MINHA AUTORIDADE, SUBESTIMOU MINHA HABILIDADE... MEU ESTOMAGO NÃO AGUENTARIA ISTO POR MAIS DOZE ANOS" .

Sábado, 26 de setembro – O serviço funerário chega ao National Arena. Mais de doze mil jamaicanos e estrangeiros se perfilaram para a passagem do corpo de Peter. O reverendo Neville L. Manning Estifanos presidiu a cerimônia. Estifanos é irmão dos "Abyssinians" Donald, Linford e Carlton "Shoes" Manning, e representa a igreja etíope ortodoxa jamaicana. A cerimônia foi realizada em aramaico e inglês.

Na sequência, o corpo de Peter atravessou as 120 milhas até a casa de sua mãe em Belmont, Westmoreland. Centenas de espectadores se alinharam na estrada que cruza a Jamaica. O caixão de Peter Tosh foi enterrado num mausoleu construído em frente ao jardim da casa da Sra. Coke, que contempla o mar do Caribe.

Segunda, 13 de junho – Outra testemunha identificou Lobban. Ele contou que foi atingido e ferido pelo homem. Um espectador próximo da casa de Tosh naquela noite, contou que viu uma perua Volkswagem estacionada do lado de fora da casa e quando três homens desceram da mesma, entrando na casa. A testemunha disse que o motorista, supostamente Steve Russel, teria se abaixado quando outros carros passavam, cujos faróis iluminavam a perua. Depois ouviu-se um grito, tiros, e então os homens correram da casa em direção ao carro. Outra testemunha comprovou que Steve estava em posse da perua da companhia naquela noite.

Quarta, 15 de junho – A Corte encerrou suas evidências e Lobban foi levado para depor. Ele testemunhou que Peter era seu 'camarada' e contou como costumava frequentar a casa de Tosh, com quem ensaiava suas poesias dub. Ele disse que sua relação com Marlene era boa mas havia esfriado quando ele contou a Peter sobre um acidente envolvendo o carro do cantor e o irmão de Marlene. Ele disse que Marlene o atacou agressivamente naquele dia, e que Peter o defendeu. Contou que a última visita que fez à casa do cantor foi na quarta-feira antes do assassinato, quando Peter havia lhe dado J$ 1000 (mil dólares jamaicanos).

*** "O DINHEIRO JA' MATOU MUITA GENTE E QUIS ME MATAR TAMBÉM..." .

Lobban descreveu conhecer Peter desde os dias em Trenchtown. "Peter me deu assistência, tudo que eu precisava ele me dava, inclusive uma cama e dinheiro para gastar" .

" Entre 6 e 8 horas da noite em questão, eu estava numa loja rua Crook em Jones Town. Fiquei lá tomando uns drinques com amigos por cerca de quatro horas. Foi então que ouvi as notícias sobre a morte do meu amigo. Eu fiquei atônito" . E se apressou em trazer uma testemunha para confirmar seu álibi.

*** "JAH, JAH ME GUIE DOS MEUS AMIGOS, POIS OS INIMIGOS EU JA' CONHEÇO. O TEMPO TODO... ELES VEM COMO CAIM MATOU ABEL. APENAS TENTANDO ENCONTRAR UM CAMINHO FACIL POR ONDE ELES POSSAM ELIMINA-LO... SEUS INIMIGOS FICAM DISTANTES E NEM QUEREM VER VOCE, ENQUANTO QUE OS SEUS AMIGOS VEM COM AQUELAS FACES SORRIDENTES..." .

No depoimento judicial apresentado pelo réu Steve Russel, ele declarou que um dos seus sócios pediu-lhe parta dar carona a três amigos. Disse que levou Lobban e outros dois homens em um furgão da companhia até a casa de Peter Tosh. Russel contou que ouviu tiros vindos da casa e, como estava tentando partir, os três pistoleiros pularam dentro do furgão, apontaram-lhe uma arma e mandaram dirigir.

Terça, 16 de junho – Steve Russel é posto em liberdade por falta de proovas anunciadas por seus advogados. Naquele dia, Lobban passou seu aniversário de 33 anos na prisão de Kingston, um lugar que lhe fora muito familiar há dezessete anos atrás.

Sexta, 25 de junho – Dennis "Leppo" Lobban é declarado culpado pela soma de três assassinatos e sentenciado à forca. O júri levou apenas 6 minutos para tomar sua decisão. Hoje, sentado na prisão de Spanish Town Dennis Lobban ainda proclama, "eu sou inocente! " .

*** Os trechos em negrito foram cedidos por Roger Steffens, quando este fez uma entrevista com Peter Tosh em 5 de novembro de 1982, pela KCRW-FM, Los Angeles, Califórnia.

FIM

Leia a
Primeira Parte

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Traduzido da revista ReggaeReport por Geraldo Carvalho
 
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